segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Capital Humano e Motivação

O entendimento que o ser humano tem sobre si mesmo tem vindo a aumentar exponencialmente, especialmente nas últimas décadas, derrubando paradigmas avessos à nossa evolução.
Na área laboral, este novo entendimento, aliado a experiências realizadas por altas entidades competentes, tem levado a resultados e constatações surpreendentes, chocantes até para a mentalidade capitalista predominante.
O ser humano não é um mealheiro e revela-se altamente imprevisível e difícil de manipular perante certas situações, tanto na sua vida pessoal como na sua vida profissional. Aliás, estas são vidas que devem ser convergentes ou arriscamo-nos, na divergência, a cair numa ilusão esquizofrénica, uma bomba relógio à espera para rebentar e fazer o seu estrago em ambas as vidas. Quanto á vida pessoal cada um sabe de si mesmo, pois a nossa imprevisibilidade aí ganha proporções estrondosas. Mas na vida profissional, se queremos maximizar o potencial do ser humano trabalhador, então o imprevisível tem que passar a ser previsível, e é aqui que os velhos paradigmas têm que sucumbir.
Procurando a resposta a velhas questões encontramos agora novas respostas.
Se gratificarmos um determinado comportamento, obtemos mais desse comportamento?
Se punirmos um determinado comportamento, obtemos menos desse comportamento?
O facto é que esta linha de pensamento não só não é linear como também se revela contraditória.
Nas organizações, empresas actuais, o esquema clássico de motivação é o incentivo monetário que, verdade seja dita, é essencial face ao ambiente socioeconómico em que vivemos. De um modo geral o dinheiro é o principal agente motivador na nossa sociedade mas, estudos actuais demonstram que em certos casos, ou áreas, a motivação monetária pode revelar-se prejudicial para o desempenho do trabalhador. Clarifiquemos.
Economistas do MIT (Massachusetts Institute of Technology), em conjunto com outras universidades, realizaram uma experiência com vários indivíduos, que consistiu em atribuir-lhes diferentes tarefas, físicas e cognitivas, tais como lançar uma bola de basquete para dentro do cesto ou resolver um quebra-cabeças, respectivamente. Foram estabelecidos 3 níveis de recompensa monetária, como agente motivador, a atribuir a cada individuo em cada tarefa de acordo com o seu desempenho. Quanto melhor o desempenho mais alta a recompensa.
Um dos resultados desta experiência foi que se a tarefa em questão for de origem física, ou seja, requeira apenas habilidade mecânica, o incentivo monetário funciona como é esperado, quanto mais alta a recompensa melhor o desempenho. Até aqui nada de novo. Mas se a tarefa em questão for de origem cognitiva, que requeira habilidades mentais, pensamento criativo e raciocínio, altas recompensas levam a piores desempenhos!
Este resultado contraria claramente tudo aquilo que pensávamos entender sobre motivação humana, mas o facto é que esta experiência foi replicada vezes sem conta por economistas, psicólogos e sociólogos em ambientes sociais diferentes e o resultado permanece o mesmo. No entanto é importante perceber que isto não significa que para tarefas cognitivas, quanto menor for a recompensa monetária melhor é o desempenho. É claro que não, como já referi o incentivo monetário tem que estar presente, se bem que há excepções, mas já lá vamos.
O dinheiro é altamente motivador, disso não há dúvida, mas em que medida?
Se um bom desempenho for mal recompensado, o trabalhador obviamente terá menos motivação. Portanto, a medida certa para o incentivo monetário é aquela em que o trabalhador recebe o suficiente por forma a não estar preocupado com o dinheiro, mas sim com a tarefa, que é o que interessa a todos quando o objectivo é maximizar o potencial de uma empresa, o desempenho dos seus funcionários, que no final de contas traz vantagens para todos!
É importante procurar motivação para além do dinheiro, principalmente nas empresas de hoje em dia, empresas de software, audiovisuais, que requerem habilidades criativas e até artísticas, algo que “não tem preço” por assim dizer. Então que factores podem influenciar a motivação do trabalhador?
Todo o ser humano tem o desejo natural de conduzir a sua própria vida, ter autonomia naquilo que faz, e este é um campo que deve ser explorado na busca da motivação do trabalhador. É claro que em muitos casos, e lá está, trabalhos de origem mais mecânica, um sistema de gestão directa, “faz isto desta forma”, é funcional e dispensa autonomia, pois o que queremos aqui é obediência. É o sistema clássico das linhas de montagem industriais. Mas se o que queremos do trabalhador é compromisso, ou “Engagement”, termo popularmente crescente, dar autonomia ao trabalhador é um importante agente motivador!
Um bom exemplo disto vem de uma empresa Australiana de software, ATLASSIAN, que a cada trimestre dispensa uma sexta feira para fazer algo brilhante. Quinta feira, no final do dia de trabalho, os funcionários são informados que durante as próximas 24 horas eles podem desenvolver o trabalho que quiserem, com quem quiserem, da forma que quiserem e, sexta feira ao fim do dia têm que apresentar à empresa o trabalho que fizeram, e fazem isto não numa sessão formal, mas sim numa pequena festa com bolo e champagne antes de irem de fim de semana. O resultado disto, é que uma vasta gama de novos produtos, assim como resoluções para problemas de software, trabalho que talvez de outra forma nunca surgisse, viu assim a luz do dia, graças a estas 24 horas de autonomia. O benefício é não só para os funcionários, como é também para a empresa e para a sociedade.
Um outro forte agente motivador é a mestria, a vontade natural que temos em nos tornar bons naquilo que fazemos. Este é, aliás, um processo que ocorre naturalmente, quanto mais fazemos uma determinada acção melhor vai sendo o nosso desempenho nessa tarefa. Isto é ciência neurológica pura e é óbvio que é na ciência que encontramos soluções para melhorar a performance humana. A mestria está intimamente relacionada com satisfação pessoal e prazer, que é algo que naturalmente queremos nas nossas vidas. É por isto que depois de um dia de trabalho, chegamos a casa e passamos uma hora ou duas a tocar viola, ou a cozinhar para amigos, ou a estudar sobre uma dúvida que surgiu no trabalho. É esta vontade interior de ser melhor que é altamente motivante, e que deve ser explorada pelas entidades paternais. Formação, formação, formação é a palavra de ordem. Não podemos sentar-nos e esperar que o funcionário faça tudo sozinho, é do interesse da empresa maximizar o seu capital humano, e o papel das entidades de ensino e formação é crucial para este aumento. Elas devem acompanhar a par e passo a evolução do entendimento de nós mesmos, sempre com métodos pedagógicos inovadores que visem estes aspectos intrínsecos ao ser humano, como propósito!
Propósito pode certamente ser o mais poderoso agente motivador. Ele “move montanhas”, quebra barreiras, atravessa oceanos, colocou o homem na Lua… a troco de quê? Dinheiro não é certamente, senão não tínhamos Cruz Vermelha, Escuteiros, Bombeiros, a Wikipédia, fundada por voluntários de todo o Mundo. O que motiva as pessoas a fazer este trabalho voluntário é o seu propósito, a auto gratificação que vem da sua contribuição, e não um agente monetário, e é aqui que podemos melhor perceber o resultado da experiência inicialmente referida, no que diz respeito a que altos incentivos monetários levam a piores desempenhos em tarefas que requeiram habilidades cognitivas.
O que acontece, é que quando o incentivo monetário se sobrepõe à verdadeira motivação humana, a autonomia, a mestria e o propósito do trabalhador, o seu desempenho não vai ser o melhor, a qualidade do produto do seu trabalho pode até ser boa, mas não será excelente. Isto é um facto científico comprovado e cada vez mais empresas estão atentas a isto, adoptando causas humanitárias, transparecendo a ligação entre o trabalho do funcionário e uma causa maior, altamente motivante, na busca que todo o ser humano empreende por um Mundo melhor!