terça-feira, 4 de setembro de 2012

Deus está nos Neurónios!

O texto que se segue apresenta novos desenvolvimentos na área da neurociência. Uma vez que não se baseia em correlações metafísicas, sendo exclusivamente focado em informação cientificamente verificada, levanta repercussões filosóficas em relação à interacção humana e à sociedade em que vivemos! Devido à densidade deste texto, e à complexidade dos conceitos científicos aqui apresentados, requerem-se múltiplas visões, uma mente aberta para compreender as suas implicações!

O cérebro Humano é uma rede de aproximadamente 100 biliões de neurónios. Experiências diferentes criam conexões neurais diferentes, que originam emoções diferentes. Dependendo de quais neurónios são estimulados, algumas conexões tornam-se mais fortes e mais eficientes, enquanto outras se podem tornar mais fracas. Isto chama-se Neuroplasticidade!
Alguém que treine para ser um músico, irá criar conexões neurais mais fortes que ligam os dois hemisférios cerebrais, por forma a tornar-se musicalmente creativo. Virtualmente, qualquer talento ou capacidade pode ser desenvolvida através de treino. Racionalidade e controlo emocional funcionam da mesma forma, são ambas conexões neurais que podem ser fortalecidas. O que quer que seja que estejamos a fazer em qualquer momento, está também a modificar fisicamente o nosso cérebro, por forma a melhorar a nossa capacidade nessa tarefa. Uma vez que isto é um mecanismo fundacional do cérebro, estar consciente disto pode extraordinariamente enriquecer a nossa experiência de vida!
Neurociência Social

Neurónios e neurotransmissores específicos, tal como a Norepinefrina, fazem disparar um estado defensivo quando sentimos que os nossos pensamentos ou valores têm que ser protegidos da influência de outros. Se formos confrontados com diferenças de opinião, os químicos libertados no cérebro são os mesmos que asseguram a nossa sobrevivência perante uma situação perigosa. Neste estado defensivo, a parte mais primitiva do nosso cérebro interfere com o pensamento racional, e o sistema límbico pode obstruir a maior parte da nossa memória activa, causando, fisicamente, "Mentalidade Estreita"! Nós vemos isto nas politicas de medo, na estratégia de jogadores de pocker, ou, simplesmente, quando alguém é teimoso numa discussão. Não importa o quão válida uma ideia seja, pois o cérebro terá dificuldade em processá-la neste estado defensivo.
A nível neural, o cérebro reage como se estivéssemos a ser ameaçados, mesmo que esta ameaça venha de opiniões inofensivas, ou factos que, de outra maneira, poderíamos achar uteis e racionalmente concordar.
No entanto, quando nos expressamos e os nossos pontos de vista são apreciados por outros, estes químicos defensivos diminuem no cérebro, e neuro transmissões de Dopamina activam neurónios de compensação, fazendo-nos sentir mais poderosos e com maior auto-estima. As nossas crenças, valores, têm um impacto profundo na química do nosso organismo. É por isto que os Placebos podem ser tão eficazes!
Auto-estima, ou Auto crença, está intimamente ligada ao neurotransmissor Serotonina. Quando a falta dela atinge proporções severas, tende a levar a estados de depressão, comportamento autodestrutivo e até suicídio.
Validação social aumenta os níveis de Dopamina e Serotonina no cérebro, o que nos permite largar fixações emocionais, e ficar mais Auto conscientes mais facilmente.
Neurónios Espelho e Consciência
Psicologia social frequentemente tem em conta a necessidade básica do Ser Humano em se encaixar na sociedade, e chama a isto "Influência Social Normativa".
Quando crescemos, a nossa orientação ética e moral é quase que inteiramente forjada pelo ambiente, portanto as nossas acções são frequentemente o resultado da validação que recebemos da sociedade! Por exemplo, "não roubar porque não é ético, ou por medo das consequências?"
Novos desenvolvimentos na área da Neurociência proporcionam-nos um melhor entendimento sobre cultura e identidade. Pesquisas neurológicas recentes confirmam a existência de Neurónios Espelho Empáticos.
Sempre que sentimos uma emoção, ou executamos uma acção, neurónios específicos disparam. Mas quando observamos outra pessoa executar essa mesma acção, ou quando a imaginamos, por exemplo correr, ou chorar, muitos destes mesmos neurónios voltam a disparar, como se fossemos nós mesmos a executar a acção!
Estes neurónios empáticos conectam-nos a outras pessoas, permitindo-nos sentir o que outros sentem, e uma vez que estes neurónios respondem à nossa imaginação, podemos experienciar um feedback (retorno) emocional vindo deles, como se tivesse vindo de qualquer outra pessoa. É este sistema que nos permite Auto reflectir.
Os neurónios espelho não reconhecem a diferença entre: "Ele e Outros", e é por isto que nós somos tão dependentes de validação social, e temos necessidade em nos encaixar na sociedade. Nós vivemos constantemente na dualidade de como nós nos vemos, e como outros nos vêm. Isto pode resultar em confusão em termos de identidade e auto-estima, e scans cerebrais revelam que nós experienciamos estas emoções negativas antes mesmo de estarmos conscientes delas.
Mas quando estamos conscientes disto, podemos então alterar essas emoções, uma vez que podemos controlar os pensamentos que as causam. Isto é uma consequência neuro química de como as memórias se tornam instáveis quando recuperadas, e de como são restauradas através de síntese proteica.
Auto-observação altera profundamente o funcionamento do nosso cérebro, activando regiões neo corticais auto-reguladoras, o que nos proporciona um incrível controlo sobre os nossos sentimentos e emoções! Sempre que fazemos isto, a nossa racionalidade e controlo emocional são fortalecidos. Quando não estamos conscientes disto, a maioria dos nossos pensamentos e acções são impulsivas, e a ideia de que estamos a reagir ao acaso, não fazendo escolhas conscientes, é instintivamente frustrante. Então, o cérebro resolve este problema criando explicações para o nosso comportamento e, fisicamente, rescreve estas explicações nas nossas memórias através de Reconsolidação da memória, fazendo-nos acreditar que estávamos em controlo das nossas acções.
Este processo é também chamado "Racionalização Inversa", e pode deixar a maior parte das nossas emoções negativas por resolver, e prontas a disparar a qualquer momento, tornando-se um alimento constante à nossa confusão, enquanto o nosso cérebro continua a tentar justificar o porquê do nosso comportamento irracional.
Este complexo, quase que esquizofrénico comportamento subconsciente, é o resultado de um sistema paralelo distribuído amplamente no nosso cérebro. Não existe um centro específico de consciência. A aparência de unidade é, de facto, cada um destes circuitos separados a serem activados e expressados a um dado momento.
As nossas experiências estão constantemente a alterar as nossas conexões neurais, alterando fisicamente o sistema paralelo, que é a nossa consciência. Modificações directas neste sistema podem ter consequências surreais, que levantam questões sobre o que é consciência, e onde é que realmente está!
Se o hemisfério cerebral esquerdo for desconectado do direito, como é no caso de pacientes com o cérebro dividido, normalmente, é possível continuar a falar e a pensar através do hemisfério esquerdo, enquanto o hemisfério direito terá capacidades cognitivas muito limitadas. O lado esquerdo do cérebro não sentirá falta do lado direito, apesar disto alterar profundamente a nossa percepção. Uma consequência disto é a incapacidade em descrever a face direita de outra pessoa. No entanto, nunca será mencionado, ou visto sequer como um problema, uma vez que nem chega a perceber que algo mudou. Uma vez que isto afecta mais do que a nossa percepção do mundo real, pois afecta também as nossas imagens mentais, trata-se não só de um problema sensorial, mas também de uma mudança fundamental na nossa consciência.
Cada neurónio tem uma voltagem que pode mudar quando iões fluem para dentro ou para fora destas células. Quando a voltagem de um neurónio atinge um certo nível, ele dispara um sinal eléctrico para outros neurónios que irão repetir o processo. Quando vários neurónios disparam ao mesmo tempo, é possível medir estas alterações na forma de uma onda.
Ondas cerebrais sustentam praticamente tudo o que nos vai na mente, incluindo memória, atenção, e até mesmo inteligência. À medida que oscilam em diferentes frequências, são classificadas em bandas, tais como Alpha, Theta e Gamma. Cada uma está associada a tarefas diferentes. Ondas cerebrais permitem às células cerebrais sintonizar-se na frequência correspondente à sua tarefa particular, ignorando sinais eléctricos irrelevantes, tal como o funcionamento de um rádio, sintonizando numa estação de rádio no meio de outras.
A transferência de informação entre neurónios torna-se óptima quando as suas actividades são sincronizadas. Esta é a mesma razão pela qual experienciamos Dissonância Cognitiva, a frustração causada pelo facto de, simultaneamente mantermos duas ideias contraditórias.
Vontade é apenas um meio para reduzir a dissonância entre cada um dos nossos circuitos neurais activos.
Evolução pode ser vista como um processo igual a este, onde a natureza tenta adaptar-se ao seu ambiente. Ao fazê-lo, evolui ate ao ponto em que que fica consciente, e começa a ponderar a sua própria existência. Quando uma pessoa enfrenta o paradoxo de querer ter um propósito, enquanto pensa que a existência humana é de pouca importância, ocorre dissonância cognitiva.
Ao longo da história, isto levou muitos a procurar orientação espiritual e religiosa, desafiando a ciência, e a sua falha em responder a questões existenciais, tais como "Porque Sou?" ou "O que Sou?".
O hemisfério cerebral esquerdo é amplamente responsável pela criação de um sistema de crenças coerente, por forma a manter um sentido de continuidade nas nossas vidas. Novas experiências recaem sobre o sistema de crenças pré-existente, e quando não vão de acordo com ele, são simplesmente negadas.
A contrabalançar isto, está o hemisfério cerebral direito, que tem tendência a fazer o oposto.
Enquanto o hemisfério esquerdo tenta preservar o modelo, o hemisfério direito está constantemente a desafiar o Status Quo. Quando anomalias discrepantes de tornam demasiado intensas, o hemisfério direito força uma revisão sobre a nossa visão do mundo. No entanto, se as nossas crenças forem demasiado fortes, o hemisfério direito pode não ter sucesso em rescrever a nossa negação. É por esta razão que pessoas mais idosas têm maior dificuldade em aceitar certos comportamentos actuais da sociedade.
Isto pode criar uma profunda confusão quando nos espelhamos em outros. Quando as conexões neurais, que fisicamente definem o nosso sistema de crenças, não estão bem desenvolvidas, ou activas, então a nossa consciência, a unidade de todos os circuitos activos separados, nesse momento pode consistir principalmente de actividade relacionada com os neurónios espelho. Tal como quando sentimos fome, a nossa consciência consiste maioritariamente de outras interacções neurais para consumir comida.
Isto não é o resultado de algum "Eu Central", que envia diferentes comandos para diferentes áreas cerebrais. Todas as diferentes partes do cérebro ficam activas e inactivas, e interagem sem um centro específico.
Tal como os pixels numa imagem, que podem expressar-se como uma imagem reconhecível uma vez unidos, a convergência de interacções neurais expressa-se como consciência.
A cada momento, nós somos, na verdade, uma imagem diferente, uma entidade diferente quando nos espelhamos em outros, quando temos fome, quando lemos este texto... A cada segundo, tornamo-nos pessoas diferentes, à medida que progredimos por estados diferentes.
Quando usamos os neurónios espelho para olharmos para nós mesmos, podemos construir a ideia de identidade. Mas quando fazemos isto com compreensão cientifica, vemos algo completamente diferente.
As sinergias neurais que produzem a nossa ondulante consciência vão muito além dos nossos próprios neurónios. Nós somos igualmente o resultado de interacção electroquímica entre hemisférios cerebrais, como somos dos sentidos que conectam os nossos neurónios a outros neurónios no nosso ambiente. É como ganhar sotaque. Nada é externo. Isto não é uma filosofia hipotética, é a propriedade básica dos neurónios espelho, que nos permite percebermo-nos através de outros. Ver esta actividade neural como apenas nossa, excluindo o ambiente, é um equívoco.
As nossas características como Superorganismo estão também reflectidas na nossa evolução, quando a nossa sobrevivência enquanto primatas dependia das nossas habilidades colectivas. Com o decorrer do tempo, regiões neo corticais evoluíram para permitir a modulação de instintos primitivos, assim como a subscrição de impulsos hedonistas, isto em benefício do grupo.
Os nossos genes "egoístas" vieram a promover comportamentos sociais recíprocos em estruturas superorganismais, descartando com eficiência a noção de sobrevivência do mais forte.
A actividade neural do cérebro ressoa mais coerentemente quando não há dissonância entre estas novas regiões cerebrais avançadas e as mais antigas, mais primitivas.
Aquilo que tradicionalmente chamamos de tendência egoísta, é uma curta interpretação sobre a implicância do comportamento de "self-service", em que características humanas são percebidas através de um falso paradigma de identidade, em vez de serem percebidas através da visão científica sobre o que somos: "Uma expressão momentânea de unidade em constante mudança, sem um centro específico".
As consequências psicológicas disto, enquanto sistema de crenças objectivo, permitem ter autoconsciência sem ligações ao "Eu imaginário", causando aumentos dramáticos de claridade mental, consciência social, auto-regulação, e aquilo que muitas vezes é descrito como "Estar no Momento".
A crença cultural mais comum tem sido maioritariamente a de que precisamos de uma narrativa, uma visão diacrónica nas nossas vidas, para estabelecer valores morais. Mas com os nossos conhecimentos actuais sobre a natureza empática e social do cérebro, sabemos agora que uma visão puramente científica, sem apego à nossa identidade ou história, produz um paradigma ético e com sentido, muito mais acertado do que os nossos patéticos valores.
Isto é lógico, uma vez que a nossa tradicional tendência para nos definirmos como constantes individualistas imaginárias, desenvolve e programa o cérebro em direcção a processos cognitivos disfuncionais, tais como rotulação compulsiva, e a necessidade psicológica de impor expectativas.
Rotulação prática está presente em todas as formas de interacção nas nossas vidas, mas ao rotular psicologicamente o "Eu Próprio" como interno, e o ambiente como externo, reprimimos os nossos processos neuro químicos, e experienciamos uma desconexão iludida.
Crescimento, e os seus efeitos laterais evolucionários, tais como a alegria e satisfação, são estimulados quando não estamos a ser rotulados durante as interacções. Podemos ter vários pontos de vista, e discordar de um ou de outro em termos práticos, mas interacções em que contudo nos aceitam por aquilo que somos, sem julgamento, são catalistas neuro psicológicos que programam o cérebro humano para reconhecer outros e aceitar sistemas de crenças racionalmente verificados, sem dissonância. Estimular este tipo de actividade neural e interacções, alivia a necessidade de distracções ou entretimento, e cria ciclos de comportamento construtivo no nosso ambiente.
Sociologistas estabeleceram que fenómenos tais como a obesidade ou fumar, emoções e ideias, espalham-se e ondulam pela sociedade na mesma forma que sinais eléctricos entre neurónios são transferidos enquanto a sua actividade é sincronizada.
Nós somos uma rede global de reacções neuro químicas.
O ciclo Auto amplificador de aceitação e reconhecimento, sustentado pelas escolhas diárias nas nossas interacções, é a reacção em cadeia que, em último plano, irá definir a nossa habilidade colectiva de superar diferenças imaginárias, e olhar para a vida de acordo com "O Grande Esquema das Coisas".